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#4 Não dizer “não”, não significa dizer “sim”


Parece tema de moda, porque finalmente se aborda com mais clareza, mas está longe de o ser. O assédio sexual sempre existiu, entre paredes de casas em quem se confia, no trabalho, na rua, em contextos sociais. Maioritariamente são as mulheres as vítimas, mas não é tão incomum como pensamos a vítima no masculino.

“Assédio sexual é todo o comportamento indesejado de caráter sexual, sob forma verbal, não verbal ou física, com o objetivo ou o efeito de perturbar ou constranger a pessoa, afetar a sua dignidade, ou de lhe criar um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou desestabilizador. (CITE)

O assédio sexual não é exclusivo de determinada idade e género, os números (aqueles que se conhecem, dos que conseguem fazer queixa) são bem evidentes disso, e é alarmante que o maior número incida nos jovens entre os 11 e os 17 anos de idade. O abusador pode viver entre paredes com a vítima, fazer parte do círculo social ou estar à distância pelas redes sociais e outras formas de interação digital. O abuso pode passar por mensagens, ameaças, manipulação. Aprisionado no jogo de quem abusa, o/a jovem dificilmente conseguirá alertar para a situação, por medo e por vergonha.

O assédio sexual não tem um contexto-tipo, podendo ocorrer nos mais diversos contextos. Invariavelmente oiço dizer a pessoa que sofreu de abuso que não conseguiu dizer “não”, condenando-se a si mesma, considerando que de alguma forma permitiu que o abuso acontecesse. Não é não. Calar não é consentir. Em toda a parte do mundo os indivíduos se expressam por comportamento verbal e não verbal e não é difícil entender quando o outro não consente, não quer, não deseja.

Episódios de assédio sexual criam danos profundos na identidade e psique da pessoa, que podem prolongar-se por décadas. Destrói a imagem que tem de si mesma e a forma como passa a relacionar-se com os outros. É humilhante, a pessoa sente-se culpada e cria aversão e medo nos relacionamentos, passando a ter comportamentos que nem ela mesma reconhece. Recolhe-se, esconde-se e muitas vezes entra em processos depressivos, ansiedade e/ou vícios. As memórias permanecem e criam terrores noturnos, multiplicam-se em pensamentos obsessivos de inferioridade, limitando a capacidade de ação e funcionamento mental. Sempre que é ativada uma memória sobre um acontecimento passado traumático, a mesma é reproduzida emocionalmente como se estivesse a acontecer no presente, havendo uma constante ativação do acontecimento, um estado de alerta permanente, a procura de respostas e dos “se eu tivesse / se eu não tivesse”.

Para qualquer um que nutra empatia por outro ser humano conseguirá imaginar o cenário opressivo, destrutivo que é vivido na mente e “no espirito” de alguém que vive neste tormento psicológico. Certo? Parece-me que é uma responsabilidade de todos nós, para que não se perpetue mais a benevolência destes tristes jogos de poder.


Dra Anabela Vitorino Costa


 

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