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#17 Falam, falam…


Em 1995, na Faculdade de Psicologia ouvia-se “não sigas psicologia clínica porque não tem saída profissional”, e continuou-se essa profecia até 2020. Os recém e os licenciados em psicologia, na sua maioria, acabavam a trabalhar noutras áreas similares ou indiferenciadas. Não investindo mais no seu próprio desenvolvimento ou na área académica. Com a pandemia, multiplicou-se o número de inscritos na Ordem dos Psicólogos. Num estado em emergência, com múltiplas perdas, compreendeu-se a importância de se salvaguardar a saúde mental.

Hoje, mais do que nunca, na história que me lembro, fala-se da Importância da Saúde Mental. E apesar de finalmente estarmos vigilantes nesse tema, não deixo de o sentir como uma ambivalência. Continua-se a correr atrás do prejuízo, a dizer-se coisas aleatórias, e em termos de substância de estratégias … não se vê. Não estou a dizer que não existam… mas não se vêm.

Sabemos (há muito) que o bem estar biopsicossocial – SAUDE – começa na psique, na mente, na esfera psicológica e emocional dos indivíduos, mas continuamos a insistir num sistema de encaminhamento para consultas de saúde mental, só depois… de muito foco nas queixas físicas e de muita farmacologia, sistema esse que sendo nacional de saúde, está completamente atrofiado na capacidade de resposta, quer em número de profissionais – que, apesar de tanta preocupação na saúde mental, continua-se uma contratação pinga-pinga- , quer na cadência das consultas. Maioritariamente, as pessoas terão que aguardar meses para a sua consulta sobre o seu problema – urgente ou emergente- de saúde mental. E é neste ponto que fico sem compreender, se se fala de saúde mental porque (finalmente) as pessoas estão mais disponíveis para esse tema e aceitam e seguem e apoiam e votam, ou se realmente existe preocupação e quer-se fazer, mas por inabilidade de estratégias não se consegue fazer melhor.

Apesar disso, o ponto que causa realmente desconforto (mais ainda!) é o facto de se continuar a achar que alguém (medidas governamentais) vai salvar aqueles que estão mal. Ora, este pressuposto parte do princípio que alguém que governa tem a idoneidade e sabe o que fazer estrategicamente (o que até agora, não é evidente) e que “os outros” estão doentes e precisam de salvação. É precisamente aqui que encaro o meu antagonismo. As pessoas - todas!, à exceção da debilidade mental e doença mental muito incapacitante – conseguem pensar! As pessoas conseguem fazer! As pessoas conseguem decidir! Se desenvolverem a sua autonomia. Tal como na educação de um filho, como podemos achar que ele terá capacidade de pensar por ele e ter autonomia na vida, se estivermos sempre a condicioná-lo, a híper protegê-lo e a tomar as decisões por ele? É isto que você quer na sua vida? Alguém que sistematicamente decida por si? Pois, lhe digo, não há saúde mental que resista. A saúde mental VIVE-SE plenamente quando as pessoas sentem que têm valor, que os seus talentos são aplicados na comunidade, quando vêm que aquilo que sabem fazer é útil aos outros. As pessoas vivem em saúde mental, quando têm escolhas que podem fazer. As pessoas vivem em saúde mental quando trabalham em locais onde reconhecem o seu valor, saem a horas de ir para casa e estar com a família. Quando têm aonde recorrer para saber como lidar com as suas questões familiares ou financeiras. Quando as pessoas que sabem sobre esses assuntos as ajudam a serem autónomas nessas questões.

As pessoas não têm saúde mental apenas porque assistem a formações de saúde mental, a maioria não quer saber sequer. Mas quando lhes são dadas outras perspetivas, outras visões sobre as suas próprias capacidades, em que elas possam PENSAR sobre como sair da situação em que se encontram, e compreendem que têm os recursos dentro de si. Ora, verão como existe saúde mental.

Para isso, é preciso, de facto, estratégia de pensantes políticos, uma estratégia global e unificadora, não dispersa em gabinete aqui ou ali, com equipas transdisciplinares e com visão sistémica. Equipas feitas de pessoas que realmente queiram saber do outro, que realmente se importem e que saibam que cada um tem valor, cada um pode pensar-fazer escolhas- agir.


 

Dra Anabela Vitorino Costa

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