Há uma espécie de ironia no desejo fantasioso de estabilidade no momento que vivenciamos, mas a ironia maior é esse desejo por si mesmo. De facto, é um “termo” baseado num conceito que apela à estrutura forte e resistente, firme, e (supostamente) de equilíbrio. Quem não deseja isso? A questão é que sendo usado dessa forma, facilmente se torna num chavão sedutor, mantendo a ilusão de que alguém ou alguma coisa irá trazer a desejada estabilidade. Dessa forma, a pessoa mantém-se ligada a (e)isso, continuando a não compreender que ela tem poder para assumir o seu caminho e que é a única responsável por ele. A pessoa que procura estabilidade, cria uma espécie de fantasia de que “a vida daquela forma estável é que será boa”, mas como, à partida, a vida não tem esse conceito “estabilidade” a pessoa vive permanentemente frustrada, ansiosa e não consegue ver o caminho que está a fazer, assim, ela vive em permanente desequilíbrio. Que afeta a mente, o físico e o psicológico.
Se pudemos aprender alguma coisa sobre as vivências no mundo, hoje e sempre, é que nada é constante, nada é para sempre, e há uma tendência natural para a “luta permanente entre os contrários”. Dessa – ação – surge, sim, o equilíbrio. Precisamente da instabilidade das circunstâncias há o encontro com o equilíbrio, através da ação. Se fugimos da instabilidade, para permanecer na “suposta estabilidade” corremos o risco de não encarar o que estruturalmente está mal, remediamos, encolhemos, mantemos o medo cativo dentro de nós. E como não encaramos o monstro, encolhidos ficamos. Numa encalhada estabilidade. Não nos mexemos para que o monstro não se solte, ou simplesmente porque “antes assim que pior”. Contudo, como a força natural do ser humano, a força motriz, anímica, é motivacional – “A palavra motivação vem do Latin “motivus”, significa movimento” - se não nos movemos, não transformamos, e adoecemos. A própria vida adoece. Deixa de fazer sentido estar na vida. Porque não há alento. Não há ânimo. É esta estabilidade que você quer?
Hoje, cada um de nós é convidado a ser o acrobata, alguns ainda resistem em sê-lo, mas não há como, porque o desafio aparece, é a vida a acontecer. E, normalmente, aparece na área que mais se tem medo, ou que mais se quer controlar, ter estabilidade. O acrobata aprende a magia do equilíbrio. Agora pense na sua vida: pense se ela não tem sido uma dinâmica constante entre o ganhar e o perder, um treino focado para se manter firme pé ante pé. Isto é estabilidade? Pode ser, mas é mais do que isso: é equilíbrio.
Para quem não desperta, nem sequer através da dor, isto é indiferente. Para quem quer sentir-se responsável na sua própria vida, quer sentir que “faz sentido”, há um questionamento permanente, sobretudo das suas ações, se são congruentes com a pessoa que quer ser, com a pessoa que quer transmitir-se aos seus filhos. Há um altruísmo, há um sentido de serviço. Essa pessoa sabe olhar para a sua vida, perceber as suas áreas de importância e as suas prioridades. Vai estar em desequilíbrio muitas vezes, mas porque tem a capacidade de se questionar e de não se manter em mesmices, vai à procura de respostas, de ajuda, de identidade, de trabalho, age perante aquilo com que está a ser confrontado. Encara a instabilidade e reconhece as suas competências para escutar, analisar, planear e agir. Sabe que quanto mais agitada é a vida mais se deve dedicar ao seu silencio interior, às suas pausas e descanso. Porque a consciência é infinitamente criativa – capacidade de encontrar soluções – e as ideias irão sempre aparecer, nada permanece no mesmo estado, portanto algo acontecerá. Ela – essa pessoa- sabe disso. E é assim que ela permanece na sua acrobacia da vida. Se lhe perguntar se ela deseja a estabilidade dir-lhe-á: que eu permaneça ligado ao meu equilíbrio interior, seja sensato nas escolhas que faço na minha vida, e que o meu medo não turve a minha visão, dessa forma a estabilidade não é um desejo, não é sequer uma questão, porque já vive em mim.
Dra Anabela Vitorino Costa
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