Normalmente, é no trabalho que a pessoa passa mais tempo do seu tempo, onde despende mais energia e onde (à partida) desenvolve mais competências. Não será então no trabalho que a pessoa mais poderá aprender sobre si mesmo, sobre as suas forças e limites, sobre as suas capacidades de resolução de problemas – criatividade –? Assim é com um profissional liberal, tudo depende dele: a gestão das suas horas de trabalho, dos seus objetivos, do seu desempenho, a análise diária de retorno em termos de gratificação emocional e financeira, e o constante foco no equilíbrio da bandeja, entre os custos e os ganhos e “investimentos” fiscais. Se um profissional liberal não estiver feliz no seu trabalho dificilmente se sustentará nele, porque essa base é (só) dele que depende. E esse profissional sabe-o.
O reconhecimento pode vir dos clientes, mas ele também não depende disso, pois reconhece que num contexto ferozmente competitivo e baloiçante, tanto se é como não. Os critérios de qualidade terão que ser elevados e a capacidade de lidar com as dinâmicas fiscais tem de ser de bailarino: firme, mas leve o suficiente para saber lidar com a dança, muitas vezes agoniante das alterações e prazos de pagamentos. Para estar leve e trabalhar com paixão, ele terá que aprender a não se deixar levar pela ansiedade.
Nas empresas, muitas vezes, o foco nas avaliações e a pressão que se coloca no desempenho das tarefas, e em objetivos, acaba por desencorajar esta possibilidade de desfrute do trabalho. Em vez da pessoa estar livre a sentir-se pleno e a crescer no desempenho do seu trabalho, ela apenas se sente sufocada, como se nunca fosse suficiente. Com o tempo, fica desgastada, a sua autoestima fragilizada e o seu autoconceito profissional fraturado. Significa que a pessoa está mais atenta ao reconhecimento do seu trabalho, pelos outros, do que por si mesmo. Neste caso, a responsabilidade pelo bem-estar e felicidade mantém-se do lado da empresa, ao invés da pessoa compreender que tem talentos, prioridades e, sobretudo, que é responsável pela vida que quer construir.
Mas, por que razão a maioria das pessoas não consegue estimar o valor que tem, os seus talentos e se condena a uma vida profissional baseada no poder dos outros sobre si? Porque vivemos e crescemos num sistema (cultural, político, educacional, organizacional) que retroalimenta esta ideia: um sistema baseado no reforço negativo, na comparação com os outros e no «não elogio» e reconhecimento das capacidades e competências do outro. Não é a competição que faz mal, é a forma como é usada. Acabando por ser mais fácil, para quem se desenvolve e integra este sistema, pensar mal dos que são bem-sucedidos do que questionar-se como é que ele próprio pode ter sucesso.
Tendo as empresas menos carga fiscal, e o verdadeiro foco no capital psicológico positivo, assim aumentassem as remunerações, as pessoas poderiam sentir mais reconhecimento e responsabilidade em doar os seus talentos, sentir-se-iam mais válidas e saberiam que não são de nenhum sistema nem de nenhuma organização. São livres. Nesse sentir de “liberdade” criariam responsabilidade por si, por aquilo que produzem e pelos outros. Chegariam mais positivos às suas casas depois de um dia de trabalho, e a suas famílias ganhariam com isso. Sentiriam que não lhes é dado um saquinho de moedas para compensar as despesas, mas sim um real reconhecimento da sua produtividade.
(continua)
Dra Anabela Vitorino Costa
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